Quando uma violência se enquadra na Lei Maria da Penha?Proteção jurídica às vítimas de violência doméstica e familiar
- Marina Jonsson
- 12 de mar. de 2024
- 4 min de leitura
A Lei n. 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha, é uma legislação fundamental no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil. Seu escopo é abrangente e aborda diversas formas de agressão, garantindo proteção e recursos jurídicos para as vítimas. Para compreender quando uma violência se enquadra na Lei Maria da Penha, é essencial analisar os critérios e disposições estabelecidos por essa legislação tão importante no nosso ordenamento jurídico.
A Lei Maria da Penha estabelece que a violência doméstica e familiar não se limita à agressão física, abrangendo também formas psicológicas, moral, sexual e patrimonial. Nós falamos mais sobre cada uma das formas de violência em outro texto do blog (confira lá!).
Mas para fins de caracterização de uma violência como sendo “doméstica e familiar”, é importante estudarmos o disposto no art. 5º da Lei Maria da Penha:
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.
Percebe-se, portanto, que a lei trata especificamente das condutas praticadas em razão do GÊNERO, em um contexto doméstico ou familiar que pode ser entendido como: NO ÂMBITO DA UNIDADE DOMÉSTICA, NO ÂMBITO DA FAMÍLIA ou EM QUALQUER RELAÇÃO ÍNTIMA DE AFETO.
a) no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
b) no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
c) em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Assim, qualquer conduta que cause dano, sofrimento físico, sexual, psicológico ou patrimonial à mulher, seja no âmbito da unidade doméstica (ainda que não seja uma relação familiar), seja no âmbito da família (ainda que não seja na mesma residência ou que sejam unidos por laços de afinidade), seja em qualquer relação íntima de afeto (independentemente de coabitarem), configura-se como violência doméstica e familiar e pode se enquadrar na legislação.
Percebe-se, então, que para além da ação ou omissão baseada em gênero, o critério da relação entre vítima e agressor é crucial. A Lei Maria da Penha contempla não só situações envolvendo cônjuges, ex-cônjuges, namorados, ex-namorados e parentes por consanguinidade ou afinidade até o terceiro grau, mas também conflitos envolvendo pessoas que convivem no mesmo espaço doméstico, ficantes, ex-ficantes, amigos íntimos, e afins.
É importante ressaltar o parágrafo único do art. 5º da Lei Maria da Penha, expressamente dispõe que “as relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual”.
Isso significa que uma relação violenta entre um casal de mulheres lésbicas também será enquadrada na Lei Maria da Penha. Você sabia?
A premissa é que toda MULHER é assegurada pela Lei Maria da Penha, justamente por ser uma lei baseada em gênero, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social (art. 2º da Lei Maria da Penha).
Mas isso não significa que MULHERES não possam PRATICAR violência doméstica e familiar.
Relação entre namoradas, esposas, mãe e filha, sobrinha e tia, vó e neta, mulheres que moram no mesmo espaço ou de alguma maneira se consideram parentes. Todas essas relações também se enquadram na Lei Maria da Penha, porque de alguma forma, todas estão sujeitas ao patriarcado, que nos ensina a violentar mulheres em razão do gênero.
O art. 3º da Lei Maria da Penha dispõe:
Art. 3º Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
§ 1º O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 2º Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.
O objetivo dessa legislação foi, portanto, criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, bem como criar Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, além de alterar dispositivos legais já vigentes, como o Código Penal, Código de Processo Penal e a Lei de Execuções Penais.
Um desses mecanismos previstos na Lei é chamado de medidas protetivas de urgência, que podem ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida (art. 19 da Lei), independentemente da instauração de inquérito policial.
Essas medidas visam resguardar a integridade física e psicológica da vítima, e incluem o afastamento do agressor do lar, a proibição de contato e a restrição de visitas, entre outras, a depender da situação. Portanto, quando uma vítima se encontra em situação de risco iminente, a Lei Maria da Penha oferece recursos para garantir sua proteção de forma imediata.
A Lei Maria da Penha incentiva a denúncia por meio de canais especializados, como as Delegacias da Mulher. É importante que a vítima busque auxílio especializado ao identificar qualquer forma de violência, garantindo assim o acesso à justiça e o início do processo de responsabilização do agressor.
Esse é um instrumento poderoso na proteção das mulheres vítimas de violência doméstica, abrangendo diversas formas de agressão e estabelecendo medidas efetivas para garantir a segurança e a integridade das vítimas. Compreender quando uma violência se enquadra nessa legislação é crucial para que as vítimas possam buscar amparo legal e romper o ciclo de violência, contribuindo assim para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. O acesso à informação sobre os direitos estabelecidos pela Lei Maria da Penha é fundamental para empoderar as vítimas e promover a conscientização da sociedade como um todo.




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